quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Clichê "global": A construção negativada da imagem da mulata.

“Olha Mangueira aí, gente”

Indignadíssima, foi como eu fiquei ao ouvir este bordão e assistir o episódio de “As Cariocas” desta terça-feira (16).


Neste, a atriz  Cíntia Rosa é Gleicy, A Internauta da Mangueira
Para começar,uma minissérie que é intitulada como “As Cariocas" ,  apresenta dez mulheres e apenas uma mulher negra!
Tudo a ver com a realidade do Rio de Janeiro, não acham?

E é justamente a negra que interpreta a única moradora de uma favela.
Será que ainda veremos sofisticadas “Helenas" na tv?

A personagem Gleicy, segundo descrições feitas em matéria publicada no site Terra, foi nascida e criada na Mangueira, ela trabalha em casa digitando teses e monografias, e, por conta disso, passa horas navegando na internet. Só que o tempo na rede nem sempre é dedicado ao trabalho. "Ela gosta de se mostrar na internet. Isso gera todo o conflito da história",

E põe conflito nisso! Temos mais uma vez a imagem da mulata libertina: “Ela, ao mesmo tempo é aquela dona de casa, que cuida do marido Armando (Eduardo Moscovis),  mas, por dentro, tem aquele gingado especial da mulata.” (site terra) E é com este gingado especial de mulata que ela deixa os homens loucos ao se mostrar seminua via webcam enquanto o marido está fora de casa ou dormindo.

Não é inquietante que, em plena semana da consciência negra, um clichê da mulher negra seja mais uma vez oferecido ao espectador?

Para incrementar, o marido de Gleicy é um flamenguista doente. O que na minha opinião, pode ser visto como mais um clichê relacionado a favela. Assim, para completar o chavão, só faltou colocar na personagem o nome de Teresa...

Para quem não se lembra da música do Jorge Ben:

“Sou flamengo e tenho uma nega chamada Tereza...”

Enfim, o marido descobre com a ajuda de um detetive, a traição virtual da mulher. Ele a leva para o jogo do Flamengo na final do campeonato brasileiro, onde, no meio da torcida, ele resolve ameaça-la com uma arma.

Ela chega até a ficar com medo, mas após a vitória do time, o marido fica tão feliz que esquece a traição.

Submissa, Gleicy também se esquece das violentas ameaças feitas pelo marido e volta para casa para fazer amor com ele.

Nada mais romântico do que ser ameaçada de morte pelo marido, e depois deitar-se com ele como se nada estivesse acontecido!

A personagem Gleicy pode ainda ser vista como "mulata profissional". Este termo é utilizado no artigo de  Sônia Giacomini: “ Mulatas profissionais: raça, gênero e ocupação”.O termo "mulata profissional" representaria que a cor da mulata  lhe agregaria necessariamente certos atributos físicos e até mesmo morais.

Numa analogia bem simples é como se para ser cozinheiro é preciso saber cozinhar, para ser mulata é preciso saber sambar.

Abaixo o link e um trecho do artigo:



a mulata profissional deve, antes de mais nada, ser portadora desses atributos como saber sambar; ter bundinha empinadinha , dentre outros(...) Deve não apenas ter o tipo físico, mas portar-se de modo a evocar essas imagens. Isso se dá, em particular, numa forma de interação com o público: ela tem de seduzir seu público. Sua capacidade de sedução, em última instância, constitui a prova de sua efetiva capacitação profissional.

Enquanto lutamos a favor da desconstrução desta imagem clichê. A rede globo nos faz o “favor” de fomentá-la.

Está na hora de enviarmos emails reclamando para a dona rede globo por uma imagem da mulher negra não limitada a clichês de favelada, a sambista, a empregada dentre outros...



A bela Cíntia, de 30 anos, foi a única protagonista do elenco escolhida por testes.  Em declaração ao site terra, ela disse que foi constrangedor gravar cenas de 'As Cariocas'. No Entanto, considera este como seu primeiro papel de maior repercussão na TV.



A atriz já atuou em Cidade dos Homens, 5X Favela - Agora por Nós Mesmos, dentre outros.

Na moda, modelos negros muitas vezes são usados somente em desfiles denominados étnicos. No teatro, cinema e tv atores e atrizes negras são vinculados a papéis   como moradores de favela.

Lembre-se que a limitação da representação do negro como personagens inferiorizados não é retratação de uma realidade. É, sobretudo, um mecanismo frequentemente utilizado para a manutenção da mesma!

Vamos lutar para que Cíntia e outros artistas e modelo, na passarela ou na tv, mostrem o seu talento em muitos outros papéis desvencilhados de clichês . Vamos costruir uma nova imagem do negro na mídia!

Só depende de nós!


PS:A história de Gleicy foi criada especialmente para a série e não retirada do livro de Sérgio Porto que dá nome à produção.

2 comentários:

  1. Parabéns Luana por este protesto. Me sinto com a alma lavada e muito bem representada por sua fala espetacular sobre a exposição do corpo negro da mulher brasileira que serve apenas como peça e chavão para o imaginário social da decadência e da decorrada.

    Afinal, para o perfil que a Rede Globo tem de mulatas, está bem no estereótipo desenvolvido há anos e que tentamos desconstruir.

    Quando somos negras, vistas como intelectuais e provamos que temos um gingado a mais e este não é refletido no corpo, mas no campo das idéias, somos vistos como seres alienígenas.

    Deus te abençõe e mil felicidades.

    ResponderExcluir
  2. Tem muito tempo que essa emissora vem denegrindo os negros. É um nojo!
    Meus parabéns pela sua observação. Tive a mesma sensação, pois, sempre estou atenta a esses pormenores que por vezes veem cheios de sutilezas e em outras descaradamente como neste caso de "as cariocas".
    E convenhamos: só apareceu uma atriz negra devido a cota que eles precisam obedecer, se não, lhe lá.

    E a mesma emissora, quase não falou nada sobre a data de hoje (da consciência negra), gastou apenas mízeros 20 segundo sem reportagem nenhuma.

    Muitos desses que se dizem intelectuais precisam abrir as cabeças.
    Parabéns
    Bjus

    ResponderExcluir