terça-feira, 7 de dezembro de 2010

A positivização da imagem do negro na sociedade e as ações afirmativas

Na semana passada, participei de um debate sobre ações afirmativas. Lá,eu e alguns colegas de diferentes perfis raciais e sociais, analisamos e nos identificamos muito com o posicionamento sobre o assunto de Marcelo Henrique Romano Tragtenberg,doutor e professor do Departamento de Física da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Analise você também e opine.
Um olhar de branco sobre ações afirmativas
 

Tudo começou com um período que passei na Inglaterra, de março de 1999 a fevereiro de 2001. Lá o negro é majoritariamente o paquistanês e o indiano.
 A componente africana da população é bem menor (infelizmente não tenho dados estatísticos para corroborar essa impressão, mas deve ser fácil obtê-los). Havia na BBC (tv estatal inglesa) uma preocupação evidente em ter dois âncoras nos jornais, sempre um deles era negro e mulher (a combinação era homem branco/mulher negra, homem negro/mulher branca).
Nos programas de debates, também se expressava a diversidade étnica, colocando entrevistadores negros, mesmo quando o programa tinha só um entrevistador. Numa das novelas, havia um diretor de escola negro que vivia um romance com uma professora loira. O que é notável é o fato do negro estar em posição proeminente dentro hierarquia escolar.
 Isto reflete o fato da Inglaterra conviver bem com a diversidade étnica? Não. Havia cerca de um assassinato por preconceito por mês, noticiado na mídia inglesa. Soube de um assassinato por racismo a 200 m de minha casa. O que há é uma consciência social da importância de valorizar a diversidade cultural e de enfrentar o racismo de frente. Não é como no Brasil, como lembra o saudoso Florestan Fernandes, onde “o brasileiro tem preconceito de ter preconceito” (in “Ação Afirmativa e Democracia Racial”, de Sandro César Sell, Fundação Boiteux, 2002). Lá, a questão étnica é assumida. Lá, há bonecas negras. É fácil achar uma no Brasil, que tem 45% de negros (5% de pretos e 40% de pardos segundo o PNAD/IBGE de 1999)?
De volta ao Brasil, um país aparentemente sem racismo, me deparei com comerciais alegres do Guaraná Antarctica. Só havia brancos, servindo e bebendo. No comercial seguinte, do mesmo produto, aparecem negros, mas só servindo e brancos só consumindo.Os negros raramente são postos como protagonistas, no máximo como coadjuvantes. No comercial da cerveja Schincariol, a música é “moro num país tropical” de Jorge Benjor, um negro, mas a maioria esmagadora das pessoas é branca. Será que isto reflete o lugar reservado ao negro no Brasil? Nos telejornais da noite, cadê os negros como âncoras? As mulheres já começam a aparecer, mas a barreira contra negros parece intransponível. No entanto, de um ano para cá, verifica-se um aumento do número de repórteres negros nos telejornais.
Certamente, antes de ir para a Inglaterra, não me sentiria incomodado com o que relatei no parágrafo acima. Meu olhar era de branco, educado numa sociedade com racismo cordial, com minha percepção contaminada por essa forma sutil de racismo. Pouco depois de voltar ao Brasil (fevereiro/2001), deu-se a Conferência da ONU contra o racismo em Durban (setembro/2001), África do Sul, à qual a delegação brasileira levou propostas avançadas para lidar com os efeitos do racismo no Brasil, entre elas a de criação de cotas para negros entrarem nas Universidades públicas.
O movimento dos negros pelo fim da segregação racial nos EUA, nas décadas de 1950 e 1960, popularizarou um conceito jurídico original: o da ação afirmativa ou discriminação positiva. Este é modo de reparar injustiças sociais é hoje bastante disseminado no mundo.
Atualmente, na sociedade brasileira, têm-se a percepção de que o negro só pode ascender socialmente através do esporte e da arte. Portanto, os modelos para os negros provavelmente vêm desses dois tipos de atividades. Pesquisas mostram em alguns casos que “quando, numa população o número de modelos sociais e econômicos (pessoas que sejam pelo menos de “classe média”) chega a uma proporção muito baixa (algo em torno de 5%), a violência, o consumo de drogas, o abandono escolar e a gravidez na adolescência crescem explosivamente” (Sell, op.cit., há outras pesquisas no mesmo sentido comentadas nesta obra). Portanto, privar os negros brasileiros da esperança de conquistar um lugar ao sol também tende a mantê-los na situação marginal em que se encontram.
Ações afirmativas não vão resolver o problema do racismo cordial brasileiro, mas no mínimo vão chamar a atenção dos brasileiros para ele e provavelmente minorá-lo. Somente uma melhora sensível nos níveis de emprego, na distribuição de renda e nas políticas sociais poderá contribuir de forma permanente para a melhoria do padrão de vida dos brasileiros, particularmente os negros.

Este texto foi adaptado. Leia o texto na íntegra:

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